quinta-feira, 21 de setembro de 2017

A CUIDADORA

 
Tanto nas redes sociais como em diversos textos jornalísticos, foi muito debatido um acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, que fundamentava a sua decisão, com a argumentação de que a sexualidade depois dos cinquenta anos já não tem a importância que assume em idades mais jovens, importância essa que vai diminuindo à medida que a idade avança, relativamente a uma mulher que na sequência de uma intervenção cirúrgica ficou inibida de ter relações sexuais, ficando ainda com outras lesões, nomeadamente incontinência, nevralgias e todo um mal estar constante e generalizado.
Como facilmente se constata, pela leitura atenta de todo o debate, que a referida afirmação despoletou, estamos a falar apenas da sexualidade no feminino.
No entanto, há uma outra afirmação que passou despercebida, provavelmente pelo facto de não versar a sexualidade, tema demasiado fácil para despertar a atenção dos intervenientes, mas de igual gravidade. (Não é por acaso, que em certas faculdades, quando as associações académicas necessitam de alertar os estudantes para alguma temática, elaboravam um cartaz com a palavra "sexo" em letras garrafais e depois escreviam em letras de tamanho mais reduzido, "agora que captamos a vossa atenção, gostaríamos de alertar para ...".)
O mencionado acórdão, refere num dos seus parágrafos e no que concerne à necessidade de contratação de uma empregada doméstica a tempo inteiro, que atenta a idade dos filhos da visada, a mesma apenas teria de cuidar do seu marido...
Esta afirmação, está associada a uma tradição resultante de anos de educação e de socialização, aliados à obrigação moral e que são transmitidos para todas as meninas, de que o papel principal da mulher é o de cuidadora.
Este papel da mulher enquanto cuidadora de filhos, marido, pais e sogros, está de tal forma enraizado, que a referida afirmação, passou completamente despercebida no referido artigo, não tendo gerado qualquer polémica (pelo menos na pesquisa que efetuei, não encontrei qualquer referência.).
Reduzir o papel da mulher, a ser mãe, filha e esposa, é muito comum numa sociedade como a nossa, onde até pessoas com formação académica e com uma profissão que decide a vida de muitas mulheres, reduzem o papel da mulher, quando os filhos já estão crescidos, ao cuidar do marido, ou seja, a mulher apenas existe enquanto associada a alguém que necessite do seu cuidado ...
Mas ainda mais grave, é que na elaboração deste acórdão interviu uma mulher, que consentiu por omissão ou por ação, que esta expressão fizesse parte de uma fundamentação tradicionalmente redutora do papel da mulher, tanto na família como na sociedade.
Ainda hoje, mesmos em famílias de casais jovens, na casa dos vinte e trinta anos, ainda se ouvem expressões, como "o meu marido ajuda ...", seja no cuidar dos filhos, seja nas atividades domésticas. Esta expressão, tem como premissa que as referidas tarefas são da mulher e ele deve ser beatificado por "ajudar", de forma esporádica e condescendente.
Ainda relativamente ao texto do referido acórdão, também é preciso analisar a perspetiva por parte do marido, que não pode ser culpado das ilações, que a referida decisão judicial retira da sua vida conjugal, partindo do princípio, que o mesmo não é um ser independente, capaz de se prover de forma autónoma.
Eventualmente, poderá ser um marido capaz de partilhar as atividades domésticas com a sua mulher, ainda mais pelo facto da mesma se encontrar parcialmente incapacitada.
É urgente alterar essa mentalidade e adaptá-la às novas realidades.
Já muito se tem feito com esse objectivo, nomeadamente em associações como a UMAR, que se desdobram em iniciativas com essa finalidade, sobretudo junto dos mais jovens, com ações de sensibilização nas escolas, com temáticas como a igualdade de género e a violência no namoro, iniciativas essas que será premente manter e incentivar.
 
Publicado na Página IGUALDADE XXI no jornal Diário Insular de 21 de Setembro de 2017



SENSIBILIZAR PARA A NÃO DISCRIMINAÇÃO

UMAR Açores disponibiliza sessões de sensibilização


Estamos no início do ano lectivo de 2017/18 e neste contexto a UMAR Açores / CIPA volta a disponibilizar um conjunto de sessões de sensibilização para a não discriminação. As temáticas disponíveis passam pela não discriminação em função do género, etnia / cultura, orientação sexual e deficiência no âmbito do programa Crescer sem Discriminar. Continuamos a trabalhar, também, as temáticas de prevenção para a violência doméstica / conjugal e violência no namoro, exemplificando em que é que consistem relações amorosas saudáveis. Estas sessões estão projectadas para diferentes públicos-alvo, podendo ser solicitadas por escolas de diferentes níveis de ensino, ou mesmo por outras instituições ou associações que achem pertinente.

Também numa perspectiva de promover a igualdade de género, este ano a Associação disponibiliza novamente acções de esclarecimento sobre direitos dos/as trabalhadores/as e boas práticas de conciliação entre a vida familiar e a profissional, dirigidas a sindicatos e a outras associações / organizações que se mostrem interessadas.

A equipa técnica é constituída por uma jurista, um sociólogo e uma psicóloga e o agendamento das sessões pode ser efectuado para os contactos da Associação.

Para mais informações sobre o nosso trabalho, poderá contactar a delegação da UMAR Açores na ilha Terceira no Edifício da Recreio dos Artistas em Angra do Heroísmo ou através dos telefones 295 217 860 / 968 687 479 ou e-mail umarterceira@gmail.com.

Publicado na Página IGUALDADE XXI no jornal Diário Insular de 21 de Setembro de 2017