quinta-feira, 8 de setembro de 2016

Mulheres refugiadas enfrentam violência sexual e de género na Europa

 
As mulheres refugiadas que tentam entrar na Europa são frequentemente mais vulneráveis à violência sexual e de género nos seus países de origem, de trânsito e de destino e enfrentam violência sexual nos centros de acolhimento sobrelotados na União Europeia (UE). Este cenário é descrito pelo relatório sobre a situação das mulheres refugiadas e requerentes de asilo na UE, discutido e aprovado a 8 de Março de 2016 pelo Parlamento Europeu em Estrasburgo. Simbolicamente apresentado no Dia Internacional da Mulher, o documento explica também que muitas das refugiadas não estão a fugir necessariamente de cenários de guerra, como é o caso da Síria. Procuram asilo para não serem sujeitas, nos países de origem, a “violação, mutilação genital feminina, casamento forçado, violência doméstica e os chamados crimes de honra”.
Existem relatos de mulheres que afirmaram terem sido forçadas a manter relações sexuais como moeda de troca para "pagar" pelas documentações necessárias para viajar ou mesmo pela própria viagem. Em alguns casos, mulheres e meninas foram tão relutantes em adiar a sua partida e a das suas famílias que se recusaram a denunciar crimes de violência sexual e de género, ou mesmo a procurarem assistência médica. Mesmo aquelas que viajam com a família são vulneráveis a abusos. Muitas vezes, por medo, não relatam os crimes e acabam por não receber o atendimento que necessitam. Algumas contam que chegaram a casar por desespero.
Mediante as restrições impostas pelos governos e com o aumento do controlo das fronteiras, as instalações de recepção e de trânsito ficaram sobrelotadas e sob tensão, elevando ainda mais os riscos para as mulheres e meninas. Além disso, refugiadas e migrantes desesperadas recorrem a rotas ainda mais perigosas nas mãos de abusadores e criminosos.
A resposta humanitária nas rotas do mediterrâneo oriental e pelos Balcãs ocidental, tem tentado dar prioridade à prevenção da violência sexual e de género em todas as actividades implementadas. A capacidade de prevenir, identificar e responder de forma adequada, no entanto, depende em grande parte dos Estados e agências da União Europeia em assumir as suas responsabilidades e adoptar medidas eficazes. Observa-se que a actual resposta dos governos, organizações humanitárias, instituições e agências da União Europeia e organizações da sociedade civil são inadequadas e não conseguem evitar e responder com eficácia ao perigo, exploração e múltiplas formas de violência de género que mulheres e meninas enfrentam por toda a Europa.
O relatório destacou algumas recomendações-chave para os governos e agências da União Europeia. Desde logo, estabelecer um sistema de resposta coordenada para a protecção de mulheres e meninas dentro e fora das fronteiras. Reconhecer os riscos de protecção, capacitar funcionários e criar procedimentos específicos para prevenir, identificar e responder à violência sexual e de género. Garantir que as respostas à violência sexual e de género não façam com que as mulheres parem de denunciar os acontecimentos, ou deixem de aceder a esses serviços e fornecer vias legais para a protecção, especialmente para mulheres, crianças e sobreviventes de violência sexual e de género, incluindo o reagrupamento familiar, e a prioridade de realojamento e reinstalação para refugiado/as com necessidades específicas.
Ainda relativamente ao relatório sobre a situação das mulheres refugiadas e requerentes de asilo na UE, os únicos três países citados são o Afeganistão, o Iraque e a Somália, dos quais entraram na Europa 145 mil, 103 mil e 22 mil pessoas desde 2014, respectivamente, de acordo com os números do Eurostat e da Frontex recentemente compilados pela revista The Economist.
A resolução alarga de forma implícita o conceito de exilado político, nele incluindo mulheres e pessoas homossexuais, bissexuais, transgénero e intersexuais que são “alvo de formas específicas de perseguição”. Tais situações “demasiadas vezes não são reconhecidas nos procedimentos de asilo”, mas constituem “motivos válidos”.
O texto sustenta que a violência contra as mulheres, meninas e minorias sexuais (descritas como “grupos vulneráveis”) é “prática corrente nos centros de acolhimento” de refugiados. Sublinha abertamente a alegada existência de “violações dos direitos humanos cometidas pela Frontex”, assim como por forças de segurança ou defesa dos países europeus e de países terceiros que têm cooperado com a Frontex, a agência europeia de controlo de fronteiras que a Comissão Europeia quer reorganizar nos próximos meses.
Ainda que sejam apresentados alguns números no relatório – 55% dos refugiados que chegaram à Grécia em Janeiro último eram mulheres e crianças, e 20 mil mulheres e meninas que todos os anos pedem asilo nasceram em países que praticam a excisão genital – reconhece-se que “é difícil compilar estatísticas”. “Fizemos o melhor que podíamos, contactámos as Nações Unidas, usámos o Eurostat e recorremos a organizações credíveis, como a Amnistia Internacional, mas nesta matéria a realidade muda todos os dias.
 
Fonte: ACNUR - Agência da ONU para Refugiados

Publicado no jornal Diário Insular de 8 de Setembro de 2016