As
mulheres refugiadas que tentam entrar na Europa são frequentemente mais
vulneráveis à violência sexual e de género nos seus países de origem, de
trânsito e de destino e enfrentam violência sexual nos centros de acolhimento
sobrelotados na União Europeia (UE). Este cenário é descrito pelo relatório
sobre a situação das mulheres refugiadas e requerentes de asilo na UE,
discutido e aprovado a 8 de Março de 2016 pelo Parlamento Europeu em
Estrasburgo. Simbolicamente apresentado no Dia Internacional da Mulher, o
documento explica também que muitas das refugiadas não estão a fugir
necessariamente de cenários de guerra, como é o caso da Síria. Procuram asilo
para não serem sujeitas, nos países de origem, a “violação, mutilação genital
feminina, casamento forçado, violência doméstica e os chamados crimes de
honra”.
Existem
relatos de mulheres que afirmaram terem sido forçadas a manter relações sexuais
como moeda de troca para "pagar" pelas documentações necessárias para
viajar ou mesmo pela própria viagem. Em alguns casos, mulheres e meninas foram
tão relutantes em adiar a sua partida e a das suas famílias que se recusaram a
denunciar crimes de violência sexual e de género, ou mesmo a procurarem
assistência médica. Mesmo aquelas que viajam com a família são vulneráveis a
abusos. Muitas vezes, por medo, não relatam os crimes e acabam por não receber
o atendimento que necessitam. Algumas contam que chegaram a casar por
desespero.
Mediante as restrições impostas
pelos governos e com o aumento do controlo das fronteiras, as instalações de
recepção e de trânsito ficaram sobrelotadas e sob tensão, elevando ainda mais
os riscos para as mulheres e meninas. Além disso, refugiadas e migrantes
desesperadas recorrem a rotas ainda mais perigosas nas mãos de abusadores e
criminosos.
A
resposta humanitária nas rotas do mediterrâneo oriental e pelos Balcãs
ocidental, tem tentado dar prioridade à prevenção da violência sexual e de
género em todas as actividades implementadas. A capacidade de prevenir,
identificar e responder de forma adequada, no entanto, depende em grande parte
dos Estados e agências da União Europeia em assumir as suas responsabilidades e
adoptar medidas eficazes. Observa-se que a actual resposta dos governos,
organizações humanitárias, instituições e agências da União Europeia e
organizações da sociedade civil são inadequadas e não conseguem evitar e
responder com eficácia ao perigo, exploração e múltiplas formas de violência de
género que mulheres e meninas enfrentam por toda a Europa.
O
relatório destacou algumas recomendações-chave para os governos e agências da
União Europeia. Desde logo, estabelecer um sistema de resposta coordenada para
a protecção de mulheres e meninas dentro e fora das fronteiras. Reconhecer os
riscos de protecção, capacitar funcionários e criar procedimentos específicos
para prevenir, identificar e responder à violência sexual e de género. Garantir
que as respostas à violência sexual e de género não façam com que as mulheres
parem de denunciar os acontecimentos, ou deixem de aceder a esses serviços e
fornecer vias legais para a protecção, especialmente para mulheres, crianças e
sobreviventes de violência sexual e de género, incluindo o reagrupamento
familiar, e a prioridade de realojamento e reinstalação para refugiado/as com
necessidades específicas.
Ainda
relativamente ao relatório sobre a situação das mulheres refugiadas e
requerentes de asilo na UE, os únicos três países citados são o Afeganistão, o
Iraque e a Somália, dos quais entraram na Europa 145 mil, 103 mil e 22 mil
pessoas desde 2014, respectivamente, de acordo com os números do Eurostat e da Frontex
recentemente compilados pela revista The Economist.
A
resolução alarga de forma implícita o conceito de exilado político, nele
incluindo mulheres e pessoas homossexuais, bissexuais, transgénero e
intersexuais que são “alvo de formas específicas de perseguição”. Tais
situações “demasiadas vezes não são reconhecidas nos procedimentos de asilo”,
mas constituem “motivos válidos”.
O
texto sustenta que a violência contra as mulheres, meninas e minorias sexuais
(descritas como “grupos vulneráveis”) é “prática corrente nos centros de
acolhimento” de refugiados. Sublinha abertamente a alegada existência de
“violações dos direitos humanos cometidas pela Frontex”, assim como por forças de segurança ou defesa dos países
europeus e de países terceiros que têm cooperado com a Frontex, a agência europeia de controlo de fronteiras que a
Comissão Europeia quer reorganizar nos próximos meses.
Ainda que sejam apresentados
alguns números no relatório – 55% dos refugiados que chegaram à Grécia em
Janeiro último eram mulheres e crianças, e 20 mil mulheres e meninas que todos
os anos pedem asilo nasceram em países que praticam a excisão genital –
reconhece-se que “é difícil compilar estatísticas”. “Fizemos o melhor que
podíamos, contactámos as Nações Unidas, usámos o Eurostat e recorremos a organizações credíveis, como a Amnistia
Internacional, mas nesta matéria a realidade muda todos os dias.
Fonte:
ACNUR - Agência da ONU para Refugiados
Publicado no jornal Diário Insular de 8 de Setembro de 2016